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A entrada da Apple no segmento desportivo é uma boa notícia para todos
Marcus Mendes

A entrada da Apple no segmento desportivo é uma boa notícia para todos

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Quem acompanha mais de perto os hobbies e interesses dos executivos da Apple, sabe de uma grande afinidade entre Tim Cook, Eddy Cue, Phil Schiller (que ainda conta como funcionário da Apple, vai?), e o mundo dos desportos. Tim Cook, vai publicando tweets a respeito dos seus interesses desportivos, com direito a até mesmo uma histórica foto polémica que aparentemente foi tirada com um iPhone – talvez o seu próprio! - numa final do Super Bowl, foto esta totalmente borrada, com um enquadramento inexistente, enfim... vê por ti próprio. Já Eddy Cue é figurinha carimbada em partidas de basquetebol, sobretudo as dos San Francisco Warriors. Além disso, ele também faz parte desde 2012, do painel de conselheiros da Ferrari, uma das clientes do estúdio LoveFrom, de Jony Ive com Marc Newson. Phil Schiller, por sua vez, é um total apaixonado por carros e por desportos automotivos. Só na sua garagem ele conta com um McLaren F1, um Aston Martin DB4 GT, um Porsche 550A, Ford GT/40, Jaguar D-Type, um Lamborghini Miura, e olha que esta lista que eu encontrei foi elaborada há mais de 6 anos. Sabe-se lá o que ele comprou neste intervalo.

Pois bem. Com tanto amor da liderança da Apple pelo mundo desportivo (e nota que eu dei apenas alguns pouquíssimos exemplos de entre os inúmeros disponíveis), era natural que a empresa também gravitasse na direção deste mundo desportivo. E ela começou de forma bastante gradual. Um modelo chamado “sport” aqui, uma cor de dispositivo baseada no mundo desportivo ali… e aos poucos essa relação foi se intensificando, até culminar no anúncio mais vistoso feito a respeito deste mundo nos últimos anos, que foi a parceria entre a Apple e a MLB para transmitir, de forma exclusiva, jogos de baseball gratuitamente no Apple TV+. Mas este, aparentemente, foi apenas o começo de uma nova fase nesse planeamento da intersecção entre a Apple e o mundo desportivo. Apenas na última semana, vimos a confirmação de que o NBA 2K23 terá uma versão para o Apple Arcade (a terceira, desde o lançamento do serviço), vimos que ninguém menos do que o AFC Richmond será uma das equipas disponíveis para jogo no FIFA 23 e, talvez mais surpreendentemente, vimos a Apple comprar os direitos de patrocínio do show de intervalo do Super Bowl para o Apple Music.

Para nós que acompanhamos este mercado mais proximamente, nenhum desses anúncios de forma isolada chega a ser uma grande surpresa. O que surpreende é o facto de todos eles terem acontecido num intervalo tão curto de tempo, voltando quase todos os negócios da empresa quase imediatamente para o mundo desportivo. Ah, e não nos esqueçamos do lançamento do Apple Watch Ultra, por motivos óbvios.

Estrategicamente, este pacote de anúncios faz completo sentido. Poucos negócios no mundo despertam uma conexão emocional maior e mais duradoura com a humanidade do que o desporto. Pensa, por exemplo, no modelo de negócio de um campeonato, sob o espetro de um serviço de assinatura. É um produto voltado para um mercado altamente qualificado, apaixonado, e que não mede esforços (ou gastos) para apoiar a sua equipa do coração. No Brasil, especialmente em épocas de finais de campeonato, não faltam histórias de fãs que pedem a demissão do emprego, ou que economizam chegando até a não comer por dias, apenas para ter dinheiro e seguir a sua equipa favorita aonde for. Aplica esta paixão para um serviço que depende justamente de uma assinatura recorrente, e tens aí uma fonte quase que literalmente infinita de faturamento. Lembra-te: o dinheiro movimentado pelo mundo dos eSports é múltiplas vezes maior do que o dinheiro movimentado pelas indústrias fonográfica e do cinema somadas. E sim, classifico aqui eSports como um desporto. Muitos podem ver uma grande distinção entre eles, mas para os cofres da Apple, é tudo a mesma coisa. Não importa se estamos a falar sobre um jogo de basquete do Apple Arcade, ou de um patrocínio do Apple Music no maior evento desportivo dos Estados Unidos, que inevitavelmente criará um laço emocional com a audiência. Aposto que nas semanas que precedem e sucedem o Super Bowl, as vendas de Pepsi (antigo patrocinador do evento) subiam vertiginosamente, e suspeito que o mesmo acontecerá com as assinaturas do Apple Music.

E mesmo que isso não aconteça de forma imediata (afinal, nem todo investimento multimilionário se paga de forma imediata), temos aqui a verdadeira chave de todos esses investimentos: ligação emocional. Ligação aspiracional. Afinidade de interesses. A matemática aqui é simples: fulana gosta de desporto. A Apple “gosta” de desporto. Logo, fulana sente-se compreendida pela Apple, e esta conexão emocional será levada em conta na hora de trocar de telefone.

“Então quer dizer que a Apple está a fazer de tudo para vender mais iPhones?”. Em uma palavra: sim. Considerando que o iPhone é o negócio mais rentável E o negócio de maior faturamento da Apple, é claro que tudo isso tem como objetivo vender mais iPhones. Mas ao mesmo tempo, tem como objetivo fortalecer o Apple Music como um grande mecenas de indústria fonográfica, fortalecer o Apple Arcade como um grande centro de diversão, fortalecer o Ted Lasso e por consequência o Apple TV+ como um grande polo magnético do zeitgeist do entretenimento desportivo. Mais do que isso, é uma forma dos executivos da Apple de encontrarem nesta união entre as suas profissões e os hobbies, a motivação necessária para seguirem trabalhando e criando tudo o que tanto gostamos de consumir. Sorte a nossa, e sorte a deles.

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Opinião