A quebra do silêncio ensurdecedor
Marcus Mendes

A quebra do silêncio ensurdecedor

PUB

No finalzinho da semana passada, para surpresa até mesmo de quem nunca acreditou no produto, a Apple confirmou o fim da linha para o HomePod original. Isso, inclusive, fez com que eu modificasse o finalzinho do meu texto da semana passada. Originalmente, ao falar sobre o silêncio ensurdecedor da evolução do HomePod, eu deixava no ar a possibilidade da Apple cancelá-lo no futuro. Isso era algo que eu via como uma possibilidade, mas não acreditava que pudesse acontecer tão cedo.

Sempre gostei muito do HomePod. Comprei o meu pouco tempo depois do lançamento, e uso-o todos os dias. Ele faz parte de uma categoria inteira de produtos que tem um problema enorme: a gente só percebe como ele é útil depois de o comprar. É um pouco como o Apple Watch, neste sentido. Acho que todo o utilizador do Apple Watch, especialmente no começo, comprou o relógio sem saber se ele seria realmente tão útil quanto a Apple estava propondo. E com as colunas conectadas também é assim. Apenas quando compras uma, percebes como é cómodo poder dar um comando qualquer, a partir de qualquer lugar da sua casa, e em questão de segundos começar a ouvir uma música, adicionar algo na sua lista de compras, descobrir quantos dias faltam até o Natal, ou qual é a velocidade média de uma andorinha sem carga.

O problema, é que o HomePod era útil para… aproximadamente metade dessas coisas. Seu som, de fato, é excelente. Até mesmo para pessoas como eu que não têm a invejável capacidade de analisar, perceber e descrever com perfeição as menores variações entre graves, médios e agudos de diferentes colunas, o HomePod entrega uma experiência excelente. Eu nunca tive coragem de ouvir músicas no volume máximo aqui em casa, afinal, sou um vizinho responsável. Mas nunca precisei. Com aproximadamente 50% do volume, minha casa já ecoa Pink Floyd sem qualquer problema ou dificuldade.

Para fazer a lista de compras, ok também. A Siri do HomePod (ainda não disponível nem no Português daí, e nem no Português daqui) entendia os comandos 2/3 do tempo, o que já é mais do que eu posso dizer da minha experiência nas outras encarnações da eternamente frustrante assistente virtual da Apple. Aliás, é aí que mora o grande problema do HomePod.

Mas antes de falar disso, preciso falar do gadget que fica exatamente ao lado do meu HomePod: um Google Home Hub (ou Nest Hub, ou seja lá qual nome o Google decidiu que este produto se deve chamar nessa semana). Uma pequena telinha colada a uma caixa de som, e com a Google Assistant embutida. Bastaram duas ou três interações com esta caixinha para me fazer desistir quase completamente da Siri para comandos que não fossem “adicione bananas à minha lista de compras” ou “toque jazz”. Nas poucas vezes em que eu tentei usar a Siri para alguma coisa fora isso, os US$350 do HomePod passaram a valer menos a pena. Enquanto isso, a cada novo resultado entregue com sucesso, os US$129 do Google Home Hub pareciam valer mais e mais a pena.

Ainda assim, o HomePod parecia-me ser um produto que, assim como a própria Siri, satisfazia a Apple na sua experiência parcialmente medíocre. Ao apoiar-se na qualidade de som, o seu único real diferencial, a Apple parecia estar satisfeita com o que vinha entregando sem grandes intenções de fazer o HomePod tomar o mundo de assalto.

Nós deveríamos ter percebido que havia algo de errado quando a Apple reduziu em US$50 o preço oficial do HomePod. Nem mesmo o iMac Pro, tão estagnado quanto a caixinha, recebeu um corte de preços. Nem mesmo depois do anúncio recente da queima final de stock. Desconto é uma palavra que nunca pareceu existir no vocabulário da Apple, mas o HomePod quebrou essa tradição.

Porém, para o azar do HomePod, nem isso parece ter sido suficiente para salvar o produto. Ele propunha-se a concorrer com o mercado da Sonos, enquanto seu único método de integração entregava uma experiência que até mesmo Samsung Bixby consegue superar.

Ironicamente, o que eu suspeito que tenha selado o destino do HomePod foi o HomePod mini. Parece-me que com o preço reduzido e a aparente aceitação maior do público, a Apple percebeu que uma coluna high-end de US$300 dólares apelaria, no máximo, a um grupo de usuários que provavelmente já tinham comprado o produto à época do seu lançamento. E de fato, nestes últimos dias um utilizador do Twitter mostrou que o HomePod que ele tinha acabado de comprar fazia parte do stock inicial de HomePods. Isso significa que todos os HomePods que a apple vendeu até hoje, foram feitos ao mesmo tempo, ao final de 2017 e começo de 2018. Triste, né?

E é uma pena mesmo o que essa segunda tentativa da Apple de emplacar uma caixa de som high-end não tenha dado tão certo. Quando o HomePod foi lançado, eu pensei “agora a Apple VAI melhorar a Siri e passará a entregar a promessa da assistente virtual inteligente que ela fez em 2011, certo? CERTO?”

Não.

Para mim, o fim do HomePod não muda tanto. Vou continuar a utilizar o produto da forma limitada que ele me permite usar. Ouvindo música, pedindo para a Siri adicionar bananas à minha lista de compras, e… só.

Marcus Mendes profile image Marcus Mendes
Publicado a
Crónicas