Apple Arcade: Round 2!
Marcus Mendes

Apple Arcade: Round 2!

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Eu já fui mais gamer. Lembro que na infância, a minha mãe sofria para me separar do meu Phantom System para que eu pudesse tomar banho e ir para a escola. Lembro-me também de ter passado horas e horas a fio a jogar River Raid e Seaquest na Atari do meu tio, na casa da minha avó, com a barriga cheia de bolinhos de chuva. Até hoje associo Atari ao cheiro a açúcar com canela em pó.

Com o passar dos anos, lembro-me também de ter sido o orgulhoso dono de um Genesis, uma espécie de versão genérica do Master System, e de ao mesmo tempo invejar os meus amigos que tinham um Master System e jogavam Alex Kidd, e meu primo com o sua NES de primeira geração.

É claro que a inveja acabou quando ganhei uma SNES, e foi definitivamente superada na noite em que, depois de muito custo, terminei o Super Mario 3. Em algum armário na casa da minha mãe há uma caixa de sapatos repleta de álbuns de fotos, e dentro de um desses álbuns há uma foto minha, de pijama, todo orgulhoso ao lado da TV CRT a exibir uma cortina vermelha a rastejar sobre um chão quadriculado e as palavras THE END espremidas no meio da tela. Foi o primeiro jogo que terminei na vida.

Depois dele, foi a vez da Nintendo 64. Disputadíssimo por meses após o seu lançamento (o que me faz perceber que pouco mudou neste mercado em 25 anos), eu e minha família passámos boa parte das férias de Natal na Flórida em 1996 em busca dessa consola. Mas valeu a pena. Quando penso na N64, não faltam boas memórias de tardes e mais tardes a jogar Goldeneye, Wave Race e, claro, Mario 64 junto com o meu irmão.

Eu não sei dizer exatamente o que aconteceu depois disso, mas foi mais ou menos depois da N64 que o meu interesse pelo mundo dos jogos passou a minguar mais ou menos na mesma velocidade em que esse mercado evoluía. Lembro-me da empolgação dos meus amigos com jogos de PC (alô, Counter Strike!) e com a PS2, lembro-me de ter comprado a PS3 exclusivamente para jogar Rock Band, Guitar Hero e um pouquinho de God of War, e… só.

De lá pra cá, já de iPhone na mão, meu histórico de download de jogos nunca foi muito extenso. Ao invés dos “grandes títulos” para iPhone, como Infinity Blade, eu gostava mesmo era do Fruit Ninja, Two Dots, Alto’s Adventure,  Mini Metro, Monument Valley e os seus congêneres. A exceção (e menção mais do que honrosa) ficou por conta de Space Age, que até hoje é uma das maiores obras-primas que já vi surgirem na App Store.

Muito bem. Com tudo isso em mente, acho que não é muita surpresa que minha primeira reação ao Apple Arcade tenha sido: meh. Lembro-me de ter assinado o trial, de ter descarregado 5 ou 6 jogos, de não ter gostado de nenhum e de imediatamente ter cancelado o trial – o que depois percebi que foi estúpido, já que teria que realmente assinar o Apple Arcade caso mudasse de ideia, mas aí Inês já era morta.

Uma das coisas que me irritou no primeiro contato com o Apple Arcade foi a quantidade de jogos que parecia ter sido feita para imitar um jogo de grande sucesso. Assim como See era para ter sido o Game of Thrones do Apple TV+, parecia-me que o Mini Motorways era para ter sido o Mini Metro do Apple Arcade. Não consigo lembrar-me de outros exemplos, mas cada jogo parecia estar lá para cumprir uma “categoria obrigatória”, ou para simular um jogo famoso que custava dinheiro do lado de fora da App Store.

Ironicamente, voltei a assinar o Apple Arcade como uma espécie de brinde quando assinei Apple One recentemente. Resolvi dar mais uma oportunidade à plataforma e, das dezenas e mais dezenas de jogos disponíveis, o que realmente me prendeu a atenção foi o joguinho do Pac Man, e o viciante Spire Blast. Sayonara Wild Hearts não foi para mim, Populus Run também não, UFO on Tape muito menos. Mas o Pac Man….

E foi por isso que fiquei extremamente feliz quando, no finalzinho da semana passada, a Apple anunciou a chegada de uma leva enorme de jogos clássicos da App Store no Apple Arcade. Lá estavam Cut The Rope, Fruit Ninja, Mini Metro, Badland, Blek, Monument Valley e tantos outros que eu já tinha passado horas a jogar anteriormente, mas que descarreguei novamente em tempo recorde no meu iPhone.

Foi naquele momento, pareceu-me, que a Apple mostrou ao mundo que tinha entendido qual deve ser a estratégia do Apple Arcade. Ao invés de fazer uma loja repleta de boas cópias dos grandes jogos da App Store, por que não incluir estes bons jogos no pacote? Se Ella tivesse feito isso desde o começo, não teria perdido estes primeiros meses essenciais do serviço a tentar emplacar algo que eu tenho a certeza absoluta que só realmente aumentou em quantidade de usuários quando passou a fazer parte do pacote do Apple One.

Esta nova atitude do Apple Arcade, que finalmente entrega a promessa de oferecer uma extensa gama de jogos de qualidade, vai muito além de uma simples correção de curso. Ela parece ser a admissão (ainda que tácita) do reconhecimento de que não nos demos por satisfeitos com imitações muito bem-feitas do que havia de mais interessante na App Store, e um compromisso com a entrega do que realmente esperávamos desde o começo em troca da nossa assinatura, ainda que acidental como no caso do meu Apple One.

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Crónicas