Aviso: esta crítica contém spoilers.
O novo thriller policial de Bobby Boermans, intitulado iHostage, podia muito bem ser sobre um indivíduo obcecado por dispositivos Apple. Mas não é esse o caso. O filme, escrito por Boermans em conjunto com Simon de Waal, é inspirado num sequestro real que decorreu numa loja da Apple em Amesterdão, há cerca de três anos.
O enredo centra-se num homem armado, de 27 anos, que invade a Apple Store em Leidseplein e faz vários reféns, exigindo um resgate de 200 milhões de euros em criptomoedas. Apesar de se tratar de um tema sério, a escolha do nome não parece ter sido a melhor e pode até gerar alguma confusão quanto à premissa do filme, mas ignoremos esse pormenor.

O caso data de 22 de fevereiro de 2022, quando Abdel Rahman Akkad, residente em Amesterdão, entrou na referida loja e sequestrou os seus ocupantes. O impasse durou cerca de cinco horas e terminou quando o refém aproveitou uma distração do agressor para fugir, tendo culminado na morte de Akkad. Como seria de esperar, o filme descreve esta história em detalhe, recorrendo a uma narrativa em mosaico: alterna entre a perspetiva do atacante, dos reféns e das equipas de emergência. No entanto, apesar de esta abordagem parecer à primeira vista envolvente, não nos deixa necessariamente presos ao ecrã.
As personalidades das personagens não são marcantes ou distintas e as suas histórias são contadas de forma bastante superficial. Não é percetível até que ponto os acontecimentos em iHostage são factuais ou ficcionais, mas o certo é que tudo no filme devia ser mais misterioso e interessante. Falta-lhe profundidade emocional e mais desenvolvimento das personagens, o que torna difícil criar empatia ou momentos de tensão.
Esta longa-metragem deixa-me a pensar que nem todas as histórias merecem ser transformadas em séries ou filmes, e em como o propósito deste thriller de uma hora e 40 minutos parece ser levar-nos a ler sobre o verdadeiro incidente. Depois de ler os artigos disponíveis na Internet, percebo que Boermans reproduziu com fidelidade os acontecimentos, mas falta-lhe algo mais. Onde está a "liberdade criativa"? Não podiam ter embelezado alguns detalhes e tornado o filme mais cativante? Como posso sequer torcer por alguma das personagens se todas elas carecem de uma personalidade marcante, que nos faça saltar do sofá? Os reféns estão tão petrificados como os iPhones da loja e não parecem estar numa verdadeira situação de perigo ou sofrimento.
Parece até estranho o sequestrador não saber da presença de alguns reféns que se escondem numa arrecadação, tendo até ignorado os que se refugiaram nos andares superiores. Para Ammar (o nome do atacante foi alterado no filme), só há uma única pessoa na loja, e é essa pessoa que recebe as várias ameaças.

Como filme, iHostage é vazio e aborrecido, e só parece ter sido feito para mostrar que os agentes de autoridade holandeses levam o seu papel muito a sério e colocam sempre a segurança dos cidadãos em primeiro lugar. Curiosamente, o thriller também se assemelha a uma espécie de publicidade à empresa de Cupertino: a marca resolve rapidamente o problema de energia da loja e, numa das cenas, um Apple Watch ajuda a diagnosticar uma personagem.
Embora Ammar afirme ter sido injustiçado pelo sistema, o filme sugere que o verdadeiro problema estará relacionado com a sua saúde mental. Na vida real, o agressor tinha antecedentes criminais por posse ilegal de armas e múltiplas ameaças. Isto parece indicar que o problema não deve ser levado a sério, pois o mesmo estaria no indivíduo, não no sistema.
Em suma, iHostage é um filme que fica aquém das expectativas. Falha em criar momentos verdadeiramente intensos, os diálogos são pouco marcantes e, no geral, falta profundidade naqueles que são os elementos centrais da trama. Ainda assim, a produção cumpre o objetivo de retratar, com fidelidade, o ataque à Apple Store em Amesterdão.
Se ainda não viste iHostage, poderás fazê-lo no serviço de streaming Netflix.
Nota: 6/10
País de origem: Países Baixos
Data de estreia: 18 de abril de 2025, na Netflix
Duração: 1h40min
Realização: Bobby Boermans
Argumento: Bobby Boermans e Simon de Waal
Elenco: Soufiane Moussouli, Admir Šehović, Loes Haverkort, Marcel Hensema, Emmanuel Ohene Boafo, Matteo van der Grijn, Eric Corton, Roosmarijn van der Hoek, Fockeline Ouwerkerk, Robin Boissevain, Louis Talpe, Jolanda van den Berg, Ahlaam Teghadouini, Thijs Boermans.